segunda-feira, 8 de março de 2010

O PAPEL DAS MULHERES NO CANGAÇO

Talvez um dos aspectos mais interessante da vida no cangaço tenha sido a participação das mulheres. Via de regra, antes do bando de Lampião não se tem notícia de que mulheres tenham andado "debaixo do cangaço". Quando um cangaceiro se apaixonava, procurava deixar sua mulher em lugar seguro, sob a guarda de alguém de confiança, visitando-a periodicamente. Foi o caso de Antônio Silvino em relação a Tita.
O novo comportamento frente às mulheres só se verifica a partir de 1928, quando Lampião permite a Maria Bonita acompanhá-lo no bando. Segundo Dadá, "sertaneja achava bonito mesmo era bandido, tudo enfeitado, tudo perfumado, tudo cheio de coisa. Aí elas iam na onda". Além deste tipo de atração, a visa do cangaço permitia às mulheres escaparem das duras tarefas da vida no campo.
Mesmo antes dessa abertura, o lado lúdico do cangaço sempre exigia a presença feminina. Após um período de intensa atividade, uma ação de maior envergadura, o descanso numa fazenda, num coito, só era plenamente satisfatório se houvesse a participação feminina. Embora a regra fosse não violentar mulheres e um comportamento duro frente à prostituição, o bando de Lampião se afastou progressivamente deste parâmetro do cangaço. Era bastante comum, nas festa e nas apropriarem de mulheres, casadas ou não, mas eram as chamadas mulheres "modernas".
É bastante provável que a entradas no bando significasse, para aquelas mulheres, a preservação de uma certa respeitabilidade, a legalização de uma relação que a sociedade só podia admitir como estável para que não se confundisse com a imagem moralista da "mulher de vida fácil". Dadá, que foi raptada por Corisco aos 13 anos, assim via sua nova situação: "Todo mundo me respeitava, vinha grupos inteiros à procura de Corisco, prá eu costurar, prá eu bordar, prá tudo. Se tinha uma mulher prá ter criança, vinha procurar a mim porque eu assistia, era quem ajeitava tudo, era quem dava àquele povo as coisas que precisava. Era 'comadre Dadá, venha cá na hora de distribuir a bóia. Eu fui como uma chefa..."
Além da vida sexual, o ingresso das mulheres no bando permitiu a redivisão do trabalho e a reprodução dos padrões sertanejos correntes no interior da comunidade nômade que se sentia sem perspectivas de volta a se tornar sedentária. As mulheres não eram "guerreiras" e tinham somente armas de defesa, armas curtas. Eram "defendidas" pelos homens de quem eram companheiras, amantes e serviçais. Algumas chegavam a ser m~eas de crianças que entregavam a pessoas de confiança, em geral influentes e "recursadas", para cria-las.
Dentro do próprio grupo exigia-se o maior respeito às mulheres dos companheiros. Conta-se, por exemplos, o caso de L´dia, mulher de Zé Bahiano, morta por este a cacetadas por tê-lo "traído" com o cangaceiro Besouro, que teve o mesmo destino sob os olhares de aprovação de Lampião.
Os sertanejos, por sua vez, encaravam como fato positivo a existência de mulheres no bando. Era a elas que em geral se dirigiam os pedidos de clemência e, não raro, intervinham junto aos cangaceiros, funcionando como um freio à violência. Além disso, a presença das mulheres significava uma garantia para as filhas e mulheres dos sertanejos surpreendidos por um ataque do bando. Uma garantia de respeito.
LIVRO: O CANGAÇO - Carlos Alberto Dória
EDITORA: brasiliense - pag. 88


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